Prefeita Sheila Lemos retira mais de R$ 2 milhões do orçamento da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer

Por - 29 de abril de 2022

Para realizar um acréscimo de R$7 milhões à Secretaria de Mobilidade Urbana (Semob) e R$ 129 mil à Secretaria de Infraestrutura Urbana (Seinfra), o Executivo anulou parcialmente recursos de outras pastas. A ação gerou indignação entre os artistas locais.

Um decreto da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista, publicado no Diário Oficial do Município (DOM) na última terça-feira, 26, gerou indignação entre artistas locais. Por meio da normativa nº 21.854, o Executivo adicionou R$ 7 milhões ao orçamento da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob). Mas para isso, retirou mais de R$ 2 milhões só da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sectel).

Os orçamentos de outras pastas também sofreram decréscimos para possibilitar a abertura do chamado crédito adicional suplementar para a Semob. Da Secretaria de Serviços Públicos, foram retirados R$ 139.411,86; do Meio Ambiente, R$ 514.823,74; da Gestão e Inovação, R$39.848,07; e do Desenvolvimento Rural, R$ 1.200.000,00. O maior decréscimo foi no orçamento da Secretaria de Infraestrutura Urbana (Seinfra), que perdeu R$ 3.113.470,90 e, por outro lado, recebeu uma adição de R$ 129 mil.

Os recursos retirados da Sectel, especificamente, eram destinados à aquisição de equipamentos e material permanente, material de consumo, obras e instalações, e até mesmo premiações culturais, artísticas, científicas e desportivas. Veja os detalhes na galeria abaixo, que reúne prints do anexo único do decreto número 21.854.

O que diz a legislação

A abertura de crédito adicional suplementar é legal e acontece quando o orçamento aprovado para a execução de determinada despesa precisa ser reforçado porque o valor inicial previsto na Lei Orçamentário Anual (LOA) foi insuficiente. Em Vitória da Conquista, o orçamento para 2022 foi aprovado pela Câmara Municipal em 22 de dezembro de 2021. O total estimado é de R$1.083.408.676,62 (um bilhão, oitenta e três milhões, quatrocentos e oito mil, seiscentos e setenta e seis reais e sessenta e dois centavos).

No município, a própria LOA 2022 (Lei nº 2.589/22) autoriza o Poder Executivo a abrir créditos suplementares, desde que sejam respeitados os limites fixados na legislação. Quando o crédito é decorrente de anulação parcial ou total de valores determinados na programação orçamentária, como é o caso do que foi aberto através do decreto nº 21.854, a Prefeitura deve respeitar o limite de até 20% dos orçamentos aprovados pela Lei Orçamentária Anual 2022.

“Um total descaso com os trabalhadores da arte”

Após a publicação do decreto nº 21.854, artistas locais se manifestaram em repúdio à atitude da prefeita Sheila Lemos. “E assim, com uma canetada, @sheilalemosandrade tira 2 milhões da cultura e comprova o que seu antigo secretário sugeriu: artista tem que estar com chapéu na mão, pedindo esmola”, afirmou Adriana Amorim, atriz e professora do curso de Cinema e Audiovisual da Uesb (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia), em uma publicação no Instagram. Ela se referiu à uma fala do ex secretário da Sectel, Adriano Gama, que gerou protestos da categoria em maio de 2021.

Nos comentários da publicação de Adriana, outras pessoas demonstraram indignação com a retirada de recursos da pasta. “A elite no poder, até quando vai ser assim? Quanto mais se tenta viver de arte, mais difícil fica sobreviver!!!”, disse um usuário da rede social. Outro internauta também criticou a ação do Executivo: “Um total descaso com os trabalhadores da arte. Um governo que não investe na arte desvaloriza a sua história. Nunca se deve confiar em políticos que fazem isso”.

Para Hendye Gracielle, produtora cultural e ex-presidente do Conselho Municipal de Cultura, a anulação do orçamento da Sectel mostra, mais uma vez, a desvalorização do segmento pela Prefeitura de Vitória da Conquista. “O decreto nos surpreende negativamente por vários motivos. Um deles é pelo fato de que o discurso sustentado até então, pela Secretaria de Cultura, é de que não há recursos para o setor, e vemos que existe (ainda que pouco), mas está sendo remanejado para outras pastas”, afirmou.

A ativista explicou ainda que a retirada dos recursos surge no momento em que artistas, produtores culturais e a população em geral aguarda a execução de políticas públicas efetivas para a redução dos impactos da pandemia da covid-19 sobre o setor. “São recursos que poderiam ser destinados, por exemplo, à reforma e reabertura do Teatro Carlos Jehovah, à revitalização de espaços culturais, […] a atividades de formação artística, a editais para premiação com valores dignos […]”, disse Hendye.

Luiz D’Luzia, ator e professor, foi mais um integrante da classe artística conquistense que se manifestou publicamente sobre o corte no orçamento municipal da cultura. “Há um projeto de estado, em todas as instâncias, para acabar com espaços públicos de arte. Aqui talvez mais intensamente e com mais êxito do que em outros lugares, porque tem muito pouca gente se incomodando”, denunciou.

Gastos e despesas da Sectel em 2021

Em dezembro do ano passado, o vereador Alexandre Xandó (PT), através do requerimento nº 214/2021, solicitou relatório das atividades desenvolvidas pela Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sectel) ao longo de 2021, além da descrição dos gastos e despesas da pasta naquele ano.

No ofício nº 036/2021, enviado à Câmara Municipal em resposta à solicitação do parlamentar, a Sectel apresentou o gasto total de R$433.858,76 durante todo o ano de 2021. Dentro desse orçamento, mais de R$ 100 mil foram utilizados para a aquisição de pisca-pisca para ornamentação; R$ 33 mil foram destinados à contratação de ternos de reis e grupo teatral; e o valor de R$ 300 mil foi investido no Edital Arte e Cultura, após protestos da classe artística local.

“A gente que é da capoeira, do samba de roda, [..] das diversas expressões culturais, estamos vendo que não está vindo nada para a cultura. A cultura periférica está chorando em Vitória da Conquista. E enquanto isso, a prefeita tira mais de R$2 milhões. E aí, como que a gente fica?”, questionou o vereador Xandó em vídeo publicado nas redes sociais.

Protesto de artistas junto ao vereador Alexandre Xandó (PT), em maio de 2021. Foto: Blog do Anderson.

A produtora cultural, Hendye Gabrielle, também criticou a forma como foram geridos os recursos da Sectel em 2021. “A divulgação da execução orçamentária demonstrou que grande parte do recurso foi gasto com pisca-pisca e outra parte sequer foi utilizada”, disse. “A impressão que temos é de que a pasta não tem um planejamento sólido e não tem uma gestão profissional. Por isso, acaba “perdendo” recursos com remanejamentos como esse”, complementou.

Prefeitura não se posicionou

No mês de março deste ano, o presidente do Conselho Municipal de Cultura, Jeremias Macário, e o secretário do órgão, Marley Vital, estiveram na Câmara de Vereadores (CMVC) para pedir mais recursos para o setor. Na ocasião, o presidente da CMVC, Luís Carlos Dudé, disse que “esse é um bom momento para se discutir cultura em Vitória da Conquista, tendo em vista a presença de nomes como os do cantor Xangai, e do professor Edgard Larry, no Governo Municipal”.

Um mês depois, a realidade é a anulação do orçamento da Secretaria Municipal de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sectel). Nossa reportagem solicitou, via e-mail, posicionamento da Prefeitura acerca da retirada de mais de R$2 milhões do orçamento da pasta, mas até a publicação desta matéria, não obtivemos resposta.

Foto de capa: Secom/PMVC.

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Uma resposta para “Prefeita Sheila Lemos retira mais de R$ 2 milhões do orçamento da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer”

  1. […] lembrar que em abril de 2022, a Prefeita Sheila Lemos decretou a retirada de mais de R$2 milhões da pasta da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sectel). Em seguida, o Executivo adicionou R$7 milhões ao orçamento da Secretaria Municipal de Mobilidade […]

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