Artigo | Bad Bunny, BaianaSystem e os gritos anti-imperialistas de janeiro
Por Rafael Flores - 31 de janeiro de 2025
O primeiro mês de 2025 deu voz a dois álbuns que, em ritmos e locais distintos do continente americano, ecoam a resistência.

Janeiro de 2025 deu voz a dois álbuns que, em ritmos e locais distintos do continente americano, ecoam a resistência e a reafirmação identitária em contextos marcados pela dominação imperialista e pela luta por soberania. De um lado, temos DeBÍ TiRAR MáS FOToS. O álbum de Bad Bunny coloca Porto Rico no centro de um discurso contra o neocolonialismo norte-americano. De outro, O Mundo Dá Voltas, de BaianaSystem, aparece em mais uma ode ao Brasil completo e complexo em suas culturas e desigualdades.
Essas duas obras surgem em um cenário global onde as tensões entre os países historicamente explorados e as grandes potências continuam a moldar políticas, economias e culturas. A carta escrita pelo presidente da Colômbia, Gustavo Petro, ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em resposta às políticas de imigração norte-americanas, ressoa como pano de fundo para o espírito desses álbuns.
Petro não se limitou a refutar a soberba imperialista, ele traça uma narrativa poética de resistência, reivindicando o valor cultural, histórico e humano da América Latina. Essa postura se conecta diretamente com os gritos de liberdade e identidade expressos nos trabalhos de Bad Bunny e BaianaSystem.
Porto Rico, um território cuja identidade latina é constantemente desafiada por sua relação ambígua com os Estados Unidos, encontra em Bad Bunny uma voz que transcende a música. Seu álbum de 2025 não é apenas um conjunto de faixas bem produzidas, é um manifesto político. Misturando reggaeton, bomba e arranjos contemporâneos, o artista explora as complexas relações de poder entre Porto Rico e os EUA, abordando temas como soberania, diáspora e a resiliência de seu povo.
O trabalho de Bad Bunny se alinha ao discurso de Petro, que, em sua carta, recusa a submissão a um modelo imperialista, exaltando a América Latina como uma terra de liberdade e resistência. Assim como Petro resgata a essência da Colômbia nas “borboletas amarelas” de Gabriel García Márquez, Bad Bunny transforma os sons e histórias de Porto Rico em um manifesto global, questionando a imposição cultural e econômica que ameaça sufocar sua identidade.
Enquanto isso, do lado sul do continente, BaianaSystem explora em minúcias o que é ser brasileiro em meio ao caos global. Como de praxe da banda, o álbum mistura gêneros locais com tendências internacionais, ao mesmo tempo em que denuncia e põe dedos na ferida. Na canção Porta-Retrato da Família Brasileira, a BaianaSystem evoca o conceito de Améfrica, que encontra eco na “Améfrica Ladina” de Lélia Gonzalez, uma ideia que ressignifica a América Latina como um território de resistência, enraizado na fusão afro-indígena e na luta contra a colonialidade.
Para Gonzalez, a Améfrica Ladina é um espaço cultural e político onde os povos historicamente oprimidos afirmam suas identidades e desafiam as estruturas de poder hegemônicas. Esse conceito se conecta diretamente à resistência cultural de Bad Bunny, que em suas músicas reivindica a soberania de Porto Rico frente à lógica imperialista dos Estados Unidos, e ao posicionamento político de Gustavo Petro, que, em sua carta a Donald Trump, reposiciona a América Latina como uma terra de liberdade e insurgência. Juntos, BaianaSystem, Bad Bunny e Petro traduzem a Améfrica Ladina em ação, afirmando que o sul global é dono de suas histórias, suas vozes e sua capacidade de subverter os legados do colonialismo.
Quando Petro diz: “não quero escravistas na Colômbia”, ele ecoa o que artistas como Bad Bunny e BaianaSystem dizem em suas músicas: não queremos ser colonizados. Não queremos que nossas culturas sejam reduzidas a exóticas ou subordinadas. Queremos que nossas vozes sejam ouvidas — e que o mundo reconheça que o local é universal, que a resistência é global e que a liberdade é inegociável.
Seja nos versos carregados de crítica social de BaianaSystem ou nos ritmos contestadores de Bad Bunny, o que emerge é uma visão de futuro onde a identidade local não é subjugada pelo poder global, mas amplificada por sua singularidade. E, nesse movimento, a América Latina reafirma seu papel como coração pulsante de resistência, beleza e liberdade.
*Rafael Flores (@rafaeh_) é jornalista formado pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb). Desde a graduação, trabalha na produção cultural e de comunicação na Bahia, além de atuar diretamente nas artes como DJ, artista visual e fotógrafo.
IMPORTANTE! Contamos com seu apoio para continuar produzindo jornalismo local de qualidade no interior baiano. Doe para o Conquista Repórter através da chave PIX 77999214805. Os recursos arrecadados são utilizados, principalmente, para custos com manutenção, segurança e hospedagem do site, deslocamento para apurações, entre outras despesas operacionais. Você pode nos ajudar hoje?
Foram doações dos nossos leitores e leitoras, por exemplo, que nos ajudaram a manter o site no ar em 2023, após sofrermos um ataque hacker. Faça parte dessa corrente de solidariedade e contribua para que o nosso trabalho em defesa dos direitos humanos e da democracia no âmbito regional sobreviva e se fortaleça! Clique aqui para saber mais.