“É o presidente e os políticos, né? Que deveria olhar mais pra essa classe pobre”, diz Patrícia, vendedora de doces

Por - 15 de maio de 2021

Das 12 às 15 horas, Patrícia fica em frente ao Banco do Brasil vendendo doces de banana e jujubas para sustentar os cinco filhos

Patrícia, 35 anos, é mãe de cinco filhos. Passou a vender doces na porta do Banco do Brasil, no Centro de Vitória da Conquista, há 6 meses, por causa da pandemia da covid-19. A mulher, que estudou até a quinta-série (sexto ano), catava recicláveis junto com o seu marido, mas o medo de ser infectada pelo novo coronavírus durante o trabalho a fez buscar outra atividade. Quando não está em frente ao banco, das 12h às 15h, ela está trabalhando como doméstica ou cuidando dos filhos.

Encontrei a vendedora em frente ao banco, debaixo do sol de meio dia. “Compra um doce para me ajudar”, foi o que ela me disse antes que eu pudesse me apresentar. Ela estava de máscara, vestia uma blusa verde estampada com a frase “Servi ao Senhor com alegria e apresentai-vos a Ele com cânticos”, demonstrando uma fé que esteve presente durante a nossa conversa, acompanhada da esperança por dias melhores.

Nascida em Vitória da Conquista, cidade que revelou amar e não ter vontade de sair, Patrícia teve uma infância boa. Seu pai era vigia no Centro e a mãe trabalhava como empregada doméstica. Entretanto, com a morte do seu pai, a situação da família se complicou e sua mãe passou a sustentar os seis filhos sozinha. A vendedora conheceu o futuro marido ainda na adolescência, aos 17 anos, e ficou grávida do primeiro filho aos 18. Quando se conheceram, ele era ajudante de pedreiro e ela dona de casa. No entanto, vendo o vizinho catar recicláveis, Patrícia conheceu a atividade e começou a coletar ao lado do esposo. Desde então, o casal sustentou a família através dos ganhos com a venda dos materiais coletados. 

Curiosamente, Patrícia começou a catar recicláveis ao mesmo tempo em que a atividade dos catadores foi reconhecida pelo Ministério do Trabalho, em 2002. Dezoito anos depois, com a chegada da pandemia, a situação em casa apertou, ela começou a vender os doces em frente ao banco e o marido continuou catando recicláveis, mesmo com o perigo e pouco retorno financeiro.

Os cinco filhos, que estudam em escolas públicas, passaram a ficar mais tempo dentro de casa e os gastos aumentaram. “É o presidente e os políticos, né? Que deveria olhar mais pra essa classe pobre e não olha. Aí você fica dentro de casa vendo a sua conta chegar, a luz, água, gás, porque se você não pagar, corta. Se tu não compra um gás, cozinha na lenha. Então, a vida tá muito difícil, muito difícil mesmo”, falou.

Patrícia consegue arrecadar cerca de 30 ou 35 reais por dia com a venda de doces de banana e jujubas, mas relata que não é fácil. “As pessoas falam, ‘ah vai caçar um trabalho, isso não é trabalho’, aí outros passam e olham pra gente com a cara assim, né? Como se a gente fosse ladrão”. A vendedora conta ainda que já está acostumada com os olhares atravessados. Isso também acontecia quando catava recicláveis. “Ah, dá uma revolta. Graças a Deus, eu só quero fazer meu trabalho de bem, não quero meter a mão em nada de ninguém, entendeu? Aí você fica triste, chateada de ver outra pessoa pensar mal de você, pela sua aparência, pela sua roupa, é muito triste.”

Porém, a dificuldade financeira não deixa a vendedora se abater. “Todo mundo é ser humano, a doença tá aí pra mostrar isso”, disse Patrícia. E, apesar do medo de contrair o coronavírus e a revolta interna com o tratamento das pessoas e dos políticos, de segunda a sexta, ela está em frente ao Banco do Brasil vendendo doces de banana e jujubas para alimentar a sua família.

*’Histórias à margem’ é uma série especial do Conquista Repórter que tem como objetivo dar visibilidade a personagens do cotidiano de Vitória da Conquista marginalizadas pela mídia tradicional e pela sociedade.

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