Moradores da Lagoa das Flores lutam pelo auxílio do poder público para lidar com transtornos gerados pela chuva

Por - 16 de dezembro de 2021

Pavimentação e instalação de sistemas de drenagem são algumas das medidas requeridas à Prefeitura pela comunidade a médio e longo prazo. Emergencialmente, foi solicitado o apoio do Poder Executivo às famílias desabrigadas após os temporais ocorridos neste mês.

Há cerca de duas semanas, Seu José Sampaio está morando em um pequeno ponto comercial, juntamente com a esposa, os nove filhos, o genro e a neta. A casa que conseguiu construir no bairro Lagoa das Flores, a partir da renda gerada pelo seu trabalho como catador de recicláveis, foi alagada com as fortes chuvas que atingiram Vitória da Conquista e todo o Extremo Sul da Bahia e Norte de Minas Gerais desde o início deste mês. 

Na última vez que a visitou, notou que a água ainda batia no seu joelho e que a parede da residência estava rachada de um lado a outro. O efeito dos temporais foi devastador para ele e sua família. Perderam móveis, objetos pessoais e ficaram desabrigados. O imóvel onde estão agora foi cedido, temporariamente, por um comerciante que se disponibilizou a ajudá-los. 

Uma das poucas coisas que conseguiram resgatar da antiga casa foi um sofá, mas como estava molhado, já não sabem mais se irá servir para uso. A situação de Seu José, da sua esposa e dos seus filhos é similar à de pelo menos outras 11 famílias da Lagoa das Flores. Como não possui asfaltamento e sistema de drenagem, o bairro foi um dos mais afetados pelos temporais ocorridos nos últimos 15 dias. 

Sala comercial na qual Seu José e sua família estão instalados, provisoriamente. Foto: José Sampaio.

Na área mais próxima à BR-116, por exemplo, formaram-se grandes poças de água que ocupam quarteirões inteiros, o que dificulta a passagem de pedestres e o acesso a estabelecimentos comerciais e a serviços essenciais, como o transporte público. A Via Bahia, empresa que é responsável pelo trecho da rodovia que dá acesso à Lagoa das Flores, foi acionada diversas vezes pelos moradores, segundo reportagem do Blog do Sena, mas nenhuma medida foi tomada. 

Protestos e reivindicações

Em protesto realizado no dia 6 de dezembro, munícipes chegaram a interditar o trecho com pneus queimados, para reivindicar soluções para o problema e melhorias para o bairro. Na ocasião, o depoimento do morador Carlos Alberto ao programa Uesb Notícias, da TV Uesb, repercutiu na imprensa local.

“Eu sinto que a gente não faz parte de Conquista porque não tem cabimento vivermos em uma situação dessa. Nossos filhos não estão podendo mais ir para a escola. Comerciantes não podem mais abrir seu comércio. Quando não é chuva, é poeira. Cadê nossos representantes? Cadê nossos deputados? Cadê nossos vereadores? E a Prefeitura simplesmente esquece da responsabilidade dela. Somos seres humanos”, desabafou.

A reivindicação dos moradores do bairro por pavimentação já dura décadas. Diversas outras manifestações foram realizadas ao longo dos últimos anos, mas eles alegam que nenhuma providência efetiva foi tomada até o momento pela Prefeitura ou pela Via Bahia. Seu José disse que participou não só do protesto do dia 6, mas também da mobilização realizada em frente à sede do Poder Executivo municipal no início desta semana, para buscar o auxílio da prefeita Sheila Lemos para atender, sobretudo, às necessidades urgentes das famílias mais prejudicadas pelas chuvas.

Com o protesto, representantes do bairro conseguiram realizar uma reunião com a atual gestão municipal e, na oportunidade, entregaram um ofício com as demandas requeridas pela comunidade da Lagoa das Flores. Segundo a advogada Betânia Nolasco, moradora da localidade, existem solicitações de curto, médio e longo prazo que precisam ser atendidas pelo Poder Público para pelo menos reduzir os impactos causados pelos alagamentos na região a cada nova temporada de fortes chuvas. 

“A curto prazo, precisamos de atenção às famílias desabrigadas que estão precisando de um abrigo urgentemente, além de cestas básicas, roupas, medicação, leite e fraldas. A médio prazo, entendemos ser necessário a limpeza do bairro Lagoa das Flores e a construção de calhas que poderiam evitar as inundações. Imaginamos que deva haver uma verba reservada no orçamento da Prefeitura para a prevenção de enchentes”, diz o texto do ofício.

O documento explica ainda que, a longo prazo, “é preciso pensar em um novo planejamento urbano e investir em soluções favoráveis à comunidade, para que ela possa dar conta do volume de água da chuva, ou seja, um modelo pensado para tempestades. Como moradores, não temos dúvidas de que o problema vai continuar ocorrendo até que os órgãos públicos tenham capacidade de pensar um projeto o qual possa absorver essa água”. 

O engenheiro civil e comerciante Robert Sampaio, que também reside na Lagoa das Flores, foi um dos representantes do bairro que assinou o ofício entregue à Prefeitura, assim como a advogada Betânia Nolasco. Segundo ele, conforme foi deixado claro na reunião da última segunda, 13, com a gestão municipal, não se tratam de obras ou ações simples, e os moradores reconhecem isso. “Mas ainda assim, elas precisam ser feitas. Nós temos direito sobre o que estamos reivindicando”, ressaltou. 

Ainda de acordo com Robert, foi dito na reunião que a Prefeitura não possui verba, atualmente, para executar quaisquer dessas medidas. No entanto, o engenheiro lembrou que a Comissão de Financiamentos Externos (Cofiex), ligado ao Ministério da Economia, aprovou nesta semana um financiamento internacional de mais de R$406 milhões para o Projeto de Saneamento Integrado e Urbanização de Vitória da Conquista – ProUrbs, que abrange obras de macrodrenagem, pavimentação e abertura de avenidas em cerca de 15 bairros da cidade.

A Lagoa das Flores não está incluída na lista de localidades que serão beneficiadas com o investimento, de acordo com o que foi divulgado pela Prefeitura até então. Apesar disso, Robert afirmou que a comunidade continuará mobilizada em prol das suas reivindicações. “Se o governo municipal não tomar nenhuma iniciativa o mais rápido possível para atender a essas solicitações, essa situação que estamos passando agora vai se tornar cada vez mais difícil”. 

Região completamente alagada na Lagoa das Flores. Foto: Betânia Nolasco.

Em nota divulgada à imprensa, a advogada Betânia Nolasco afirmou que os recentes eventos que têm ocorrido no bairro são “recorrentes e catastróficos”, podendo até mesmo “custar vidas”. Ela lembrou que, no último ano, uma criança da comunidade morreu afogada em um pequeno açude devido ao volume elevado de água gerado pelas chuvas. 

A criança era filha de Seu José Sampaio. Ele estava saindo da igreja quando recebeu a notícia. Era um menino e tinha apenas um ano e cinco meses de vida quando faleceu. Hoje, o maior medo do catador é que algo assim se repita. 

Na reunião da segunda, 13, a Prefeitura se comprometeu a prestar um suporte, através da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Semdes), às famílias da Lagoa das Flores desabrigadas por conta das chuvas. O processo até que isso de fato aconteça, entretanto, tem sido lento e preocupa as famílias que necessitam urgentemente desse apoio, que virá em forma de aluguel social e de doação de cestas básicas, de acordo com o que foi informado a Seu José. 

Até esta quarta-feira, 16, quando conversou com o Conquista Repórter, Seu José contou que sua família foi inscrita numa espécie de Cadastro Social da Semdes, que visa mapear os munícipes diretamente prejudicados pelos temporais. Enquanto o auxílio da Prefeitura não se traduz em ações efetivas, os moradores do bairro que estão desabrigados contam com a solidariedade de outras pessoas.

Você pode ajudá-los fazendo qualquer tipo de doação na Loja Dois Irmãos, localizada na Avenida Bartolomeu de Gusmão, nº 368, bairro Jurema. Caso queira contribuir de outras formas, envie uma mensagem para o WhatsApp (77) 98824-8032.

Nossa reportagem solicitou posicionamento da Prefeitura e da Via Bahia acerca das questões tratadas nesta matéria, mas até a sua publicação, não obtivemos resposta.

Foto de capa: Betânia Nolasco.

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